O mito da unidade da resistência ucraniana

Por: Daniel Albuquerque Abramo | Data: 02/04/2022 | Publicado originalmente em A Coisa Pública Brasileira
Um agradecimento especial ao camarada Arthur Siqueira Veronez e a camarada Cintia Xavier.
“Como é difícil acordar calado,
Se na calada da noite eu me dano,
Quero lançar um grito desumano,
Que é uma maneira de ser escutado.”
“Cálice”, de Chico Buarque e Milton Nascimento.
Durante a cobertura do conflito que ocorre no presente momento no leste europeu, somos levados a acreditar que existe apenas um pensamento na Ucrânia: a defesa de seu governo. Contudo, quando observada de forma crítica, tal narrativa não parece se sustentar. Exatamente nesse sentido, A coisa pública brasileira, no intuito de esclarecer sobre o que ocorre na Ucrânia neste presente momento, publica o presente artigo, do referido autor para que brasileiros possam ter informações relevantes que nos vem sendo negadas, devido ao intenso bloqueio midiático.
A coisa pública brasileira, seguindo sua linha editorial de mostrar “a história que a história não conta”, isto é, da classe trabalhadora, orgulhosamente apresenta uma extensa investigação jornalística para compreender melhor essa questão. A maioria das fontes não está disponível em português e a maioria deste material não foi publicado em nosso país. Acreditamos que o povo brasileiro e todos aqueles falantes da comunidade lusófona tem o direito de ter tais informações, para julgarem por si próprios os eventos que ocorrem atualmente no leste da Europa.
Observação importante: Enquanto esta publicação era confeccionada (dias 29, 30 e 31 de março), ao que parece, por coincidência ou não, foi bloqueado o acesso ao site do jornal ucraniano “comments.ua”, onde obtivemos boa parte de nossas fontes. Tal fato gerou enorme preocupação quanto a possibilidade de jogar algumas das fontes em nulidade. Pois, sem acesso à página, seria impossível a comprovação do que está escrito no presente artigo. Ainda assim, como já havíamos salvo os sites e links em PDF e capturas de tela, conseguimos finalizar a publicação.
Na manhã do dia 31 de março nos utilizamos de uma ferramenta de VPN, simulando conexão da Inglaterra e dos Estados Unidos da América, de onde era possível acessar o site normalmente. No mesmo período o site estava bloqueado para conexões do Brasil e Rússia, o segundo país foi utilizado como teste de controle. Porém, o site já voltou a funcionar normalmente no Brasil no dia 31 de março durante o começo da noite. Para não arriscar jogar fontes em nulidade, caso o site seja bloqueado no Brasil novamente, disponibilizaremos links tanto do original como da página em cache, e junto às fontes estará também uma pasta no mega, com PDFs de todas as páginas das matérias aqui utilizadas como fonte, de forma que seja comprovável tudo o que está sendo afirmado no presente artigo.

INTRODUÇÃO — QUANDO A REPRESSÃO E A TORTURA FORAM PERIGOSOS PARA JORNALISTAS ESTRANGEIROS:
Conforme relatado por veículos da mídia nacional, André Liohn, correspondente do UOL e da Folha de São Paulo na Ucrânia, decidiu deixar o país no dia 26 de março com medo de ser preso ou sofrer violência por parte do governo ucraniano. Recentemente, o governo do país intensificou e formalizou por lei sua habitual repressão, agora também contra jornalistas estrangeiros, com penas de até 12 anos de cadeia e possível tortura sob a batuta de milícias neonazistas. Ao próprio portal UOL afirmou o repórter em questão:
“”Desde o início da operação especial militar da Rússia, em 24 de fevereiro, um jornalista foi morto por semana, em média, na Ucrânia. A responsabilidade por essas mortes recaiu sobre as tropas russas, mas sabemos que a chance de que esses profissionais tenham sido mortos por ucranianos, e não por russos, é muito grande”, concluiu.” [Fonte, 2022]
Tal declaração, porém, pode chocar muita gente. Sobretudo quem acompanha as notícias sobre o confronto na mídia hegemônica. Por essas vias, parece só existir uma categoria de narrativa: a do bem contra o mal. Isto é, se algo heróico acontece, foi a Ucrânia, se algo de ruim foi feito, decerto deve ter sido a Rússia. Também é visível que as notícias provenientes da mídia ucraniana quase não contrastam e são quase sempre não contraditórias, isto é, seguindo uma mesma linha de pensamento.
Mas afinal, como isso é possível? A resposta é inglória: apenas com muita repressão e com muita censura. O que, infelizmente, é precisamente a situação que está acontecendo por lá já tem algum tempo, primeiramente direcionado aos cidadãos e os jornalistas ucranianos, e formalizada recentemente também contra jornalistas estrangeiros. Sobre isso, observemos o que mais afirmou o insuspeito jornalista brasileiro André Liohn:
“Ele relatou atos de censura por parte de forças policiais e criminalização de jornalistas pelo governo ucraniano.
[…] ‘Por que vocês estão deixando a Ucrânia?’, me perguntou um dos policiais com um fuzil Kalashnikov preso próximo ao corpo, enquanto olhava minhas fotos, mensagens e atividades nas mídias sociais usando meu próprio telefone.
[…] Dias antes, na cidade de Zaporíjia, no sudeste da Ucrânia, um grupo de policiais havia me abordado exigindo uma suposta senha que provaria minha real identidade. Sem entender se eles estavam me testando com uma mentira, eu simplesmente disse a verdade: que nunca ninguém havia me dado nenhuma senha. Por causa disso, fomos tirados do carro e interrogados como se fôssemos responsáveis por algum crime muito grave.
[…] No mesmo dia, outros fotógrafos foram levados contra a vontade para uma delegacia de Zaporíjia e mantidos lá até que seus empregadores, neste caso, a revista de um grande jornal norte-americano, conseguisse entrar em contato com autoridades locais provando a identidade dos fotógrafos.
[…] Um fotógrafo polonês foi severamente agredido por policiais no centro de Kiev em plena luz do dia e praticamente à vista de todos no local. Após apresentar sua credencial, ele ainda foi acusado de falsificar sua identidade, agredido fisicamente e exposto à violência moral. As autoridades ucranianas foram alertadas e, até agora, não apresentaram nenhuma resposta.
Nas redes sociais, jornalistas ucranianos estão manifestando publicamente medo dessas ações e perseguições. Eles — mais do que todos — são os mais vulneráveis em relação à censura e à violência do Estado.
[…] Em simultâneo, em posse de armas e fundos enviados por dezenas de países europeus e pelos Estados Unidos, o governo ucraniano está conseguindo reverter a situação — de não apenas se opor à invasão russa, mas também ensaiar um possível contra-ataque para recuperar áreas ucranianas ocupadas desde 2014.
Nessa posição, o governo se sente menos dependente da opinião pública. Como pode se comunicar diretamente com apoiadores nas redes sociais, o governo de Zelensky deixa de ter interesse em jornalistas que atuam com independência.” [Fonte, 2022]
Sobre o mesmo caso, em defesa do jornalista brasileiro André Liohn, correspondente do UOL e da Folha de São Paulo na Ucrânia, também relatou o Ministério das Relações Exteriores da República Popular de Donetsk em sua conta oficial no Telegram:
“Declaração do Ministério das Relações Exteriores da DPR no caso de perseguição a jornalista do Brasil por autoridades ucranianas:
Em 29 de março, o jornalista brasileiro André Liohn foi forçado a deixar a Ucrânia devido à perseguição, pressão e ameaças de morte das autoridades ucranianas. Aparentemente, foi assim que Kiev decidiu implementar uma lei recentemente assinada pelo presidente ucraniano, que introduz responsabilidade criminal pela divulgação de informações sobre a transferência de armas e tropas.
À primeira vista, tal ato poderia ter uma certa conveniência durante uma lei marcial. No entanto, se estudarmos cuidadosamente suas disposições, bem como as primeiras consequências do processo legal, uma conclusão óbvia se oferece: todos aqueles que se atrevem a fornecer informações objetivas às* autoridades ucranianas serão equiparados a criminosos para Kiev. No exemplo de um jornalista do Brasil, observamos o pânico progressivo de Kiev com medo da verdade, que vaza inevitavelmente pela tela das fábulas da propaganda ucraniana.
Contrariando não apenas os princípios da liberdade de expressão e do humanismo, mas também uma série de atos do Direito Internacional Humanitário (Declaração Universal dos Direitos Humanos, Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, Protocolo Adicional I às Convenções de Genebra, etc.), as autoridades ucranianas estão fazendo de tudo para que o distintivo “imprensa” não seja percebido como proteção durante o conflito armado, mas, ao contrário, como motivo para se tornar o alvo número um, na aniquilação de todas as pessoas que estão tentando falar sobre os acontecimentos na Ucrânia do ponto de vista da objetividade, humanidade e bom senso.
Os correspondentes que trabalham no Donbass sabem disso em primeira mão. Ao longo dos 8 anos de conflito, muitos deles estavam sob fogo direto das forças armadas da Ucrânia e alguns, infelizmente, não puderam retornar de sua tarefa editorial. Ao custo de suas próprias vidas, eles proporcionaram um processo de percepção* para a comunidade mundial, que já é irreversível.No entanto, agora, para cada representante da mídia que tenha consciência e honra profissional, é extremamente importante fazer todo o possível para aumentar a velocidade dessa percepção, da qual depende o destino de milhões de pessoas.
Nesse sentido, recomendamos, em primeiro lugar, que o público ocidental do Ministério das Relações Exteriores da RPD leia uma entrevista de André Liohn à agência UOL. Particularmente importante é a parte onde o Sr. Liohn admite abertamente que são as autoridades ucranianas que provavelmente são responsáveis pelas mortes de jornalistas em território ucraniano, e não pelos militares russos, como dizem na Ucrânia.” [Fonte, 2022]
A mídia ocidental nos vende a ideia de “resistência uníssona”, mas sabe muito bem, pois esta tem repórteres lá, que o que existe é uma imensa repressão do governo contra cidadãos ucranianos que o deploram e querem o fim do seu terrorismo de estado. Enquanto isso, nos é negada qualquer informação sobre esse relevante fato. Pelo contrário, a maioria das informações que nos chegam, vem precisamente, por esse ponto de vista e através desse mecanismo.
Tal só é possível por conta da censura fundamentada em forte repressão, que se inicia no ponto de origem da notícia, isto é, na Ucrânia, não permitindo que certas informações negativas aos interesses do governo transitem, em benefício de outras informações positivas ao regime.
Após esse processo de “filtragem”, tais informações passam pelos grandes polos ocidentais de produção de notícias, isto é, Reuters, BBC, DW. Até que, finalmente, chegam em nós na outra ponta, em um noticiário nacional onde a censura ocorre pela seletividade do foco editorial e pela reprodução de notícias, previamente preparadas em tais agências estrangeiras, nas redes de televisão nacionais, como a Globo, ou a Record.
Isso, claro, também não aparece-nos habitualmente nas notícias que seguem a linha de Kiev/EUA/OTAN/UE, mas alguns jornais ucranianos, desde pelo menos o dia 7 de março, se vangloriam de estarem prendendo traidores, agentes pró-russos, sabotadores, etc. Afinal, quem são essas pessoas? São realmente “russos” e “agentes pró russos”?
Conforme nos relatou em entrevista exclusiva, o jornalista ucraniano Dmitri Kovalevich, tratam-se, em verdade, de cidadãos ucranianos em sua grande maioria, que se opõem ao governo:
“O terror da extrema-direita na Ucrânia deve ser interrompido e nossos camaradas devem ter a possibilidade de voltar para casa e trabalhar aqui legalmente. O fascismo e o racismo são uma característica do nosso regime (bem, o presidente Zelensky é apenas um fantoche, um ator contratado atuando como Presidente). Nossa ideologia nacional desde 2014 é baseada em culpar o comunismo e a ideologia de esquerda.
Mas o fascismo também ajuda a promover reformas neoliberais aqui — aumentando os preços de tudo, enquanto qualquer categoria de protesto contra isso está sendo rotulado como “pró-russo” e impiedosamente agredida por paramilitares fascistas. Este é um modelo para qualquer outro país. O fascismo é apenas uma ferramenta do capitalismo destinada a obter mais lucros. Se perder uma guerra em qualquer lugar — isso o abala (o capitalismo) — e é um alívio para os trabalhadores em todos os lugares.” [Fonte, 2022]
É necessário todo um circuito da repressão e da censura para ser possível sustentar essa narrativa, uma “história perfeita” que ignora a existência de dissidentes e de dissenso, sem furos, tal como vende o governo ucraniano. A realidade, ou seja, a verdade, nunca se apresenta perfeita, pelo contrário, esta aparece sempre confusamente e contraditória.
Quando esta aparece sob formas “perfeitas”, não se trata de verdade, e sim, provavelmente, de alguma ilusão ou supressão da perspectiva de alguma parte envolvida. Em suma, é utilizado o padrão de ocultação. Sobre isso, em seu livro de nome “Padrões de Manipulação na Grande Imprensa”, utilizado como uma das bases teóricas para todo o artigo, nos diz o teórico socialista, e aclamado jornalista brasileiro, Perseu Abramo:
“É o padrão que se refere à ausência e à presença dos fatos reais na produção da imprensa. Não se trata, evidentemente, de fruto do desconhecimento, e nem mesmo de mera omissão diante do real. É, ao contrário, um deliberado silêncio militante sobre determinados fatos da realidade.
[…] A ocultação do real está intimamente ligada àquilo que frequentemente se chama de fato jornalístico. A concepção predominante — mesmo quando não explícita — entre empresários e empregados de órgãos de comunicação sobre o tema é a de que existem fatos jornalísticos e fatos não-jornalísticos.
[…] Evidentemente, essa concepção acaba por funcionar, na prática, como uma racionalização a posteriori do padrão de ocultação, na manipulação do real. Ora, o mundo real não se divide em fatos jornalísticos e não-jornalísticos, pela primária razão de que as características jornalísticas, quaisquer que elas sejam, não residem no objeto da observação, e sim no sujeito observador e na relação que este estabelece com aquele.
[…] Nesse sentido, todos os fatos, toda a realidade pode ser jornalística, e o que tornará jornalístico um fato independe das suas características reais intrínsecas, mas depende sim, das características do órgão de imprensa, da sua visão de mundo, da sua linha editorial, do seu “projeto”, enfim, como se diz hoje.
Por isso é que o padrão de ocultação é decisivo e definitivo na manipulação da realidade: tomada a decisão de que um fato “não é jornalístico”, não há a menor chance de que o leitor tome conhecimento de sua existência, por meio da imprensa.”
Perseu Abramo em “Padrões de manipulação na grande imprensa”, 2016.
Em suma, se existe repressão e censura na Ucrânia, como se manifesta? Para tal, devemos observar como vem agindo o aparato repressor estatal ucraniano desde o começo da nova fase do conflito que já se arrasta desde 2014, com foco evidente no serviço secreto ucraniano, que atua muito mais como uma polícia política do que como uma agência de inteligência, cujo objetivo é resguardar a soberania e o interesse nacional. Isto é precisamente o que veremos adiante.
PRIMEIROS RELATOS DE REPRESSÃO E CENSURA:
Primeiro, precisamos elaborar sobre quem é o Sluzhba Bezpeky Ukrayiny (SBU), o serviço secreto ucraniano, ator principal da repressão e da censura na Ucrânia. Conforme publicamos em nossa última investigação jornalística:
“O SBU, criado em setembro de 1991 após a dissolução da União Soviética e da independência da Ucrânia, é um sucessor da KGB ucraniana no ramo de inteligência, subordinada ao Presidente da República. Após o golpe de 2014, esta passa por uma reformulação e desenvolve sua perspectiva de segurança nacional com base no combate do inimigo interno. Ou seja, o SBU investigou ativamente os cidadãos ucranianos, fundamentando-se em premissas ideológicas de extrema-direita (supremacia europeia), adotadas pelo Estado-Nacional da Ucrânia após o golpe de 2014 e de uma série de reformas radicais, que alteraram profundamente o espírito da constituição ucraniana. Tal processo acabou por criar um aparato formal, jurídico e burocrático, exclusório e característico de um estado policial, dando sustentação e apoio explícito a um aparato ilegal de repressão, tortura, perseguição e assassinato indiscriminados contra opositores políticos e também contra grupos de minorias do país.” [Fonte, 2022]
Além disso, aprofundando nossos conhecimentos para melhor compreensão do presente artigo, é relevante a compreensão de que o SBU, opera também como uma imensa agência cibernética de propaganda, contra-propaganda e espionagem, dispondo inclusive, de uma doutrina informacional de segurança para tal [1] [2].
Desde o golpe de 2014, EUA, UE e OTAN tem relações muito próximas com o SBU, ainda que sob pretextos nem sempre verossímeis. Sobre isso, é possível obter informações da própria “Radio Free Europe”, um veículo, como se diz no jornalismo, completamente “chapa-branca”, isto é, alinhado a um dos lados no presente conflito, neste caso em particular, UE, OTAN e EUA. Observemos o que diz uma matéria no site da Rádio Free Europe, publicada em 2019:
“Por outro lado, o fracasso em reformar o serviço de segurança, dizem os críticos, pode atrapalhar os esforços mais amplos para conter a corrupção e o crime econômico, já que as atividades da agência têm muito a ver com os esforços da Ucrânia para reforçar o Estado de Direito, e sua reputação duvidosa desencoraja estrangeiros investidores de trazer negócios para um país onde o serviço de segurança permitiu o crime econômico.
“Agora há uma oportunidade real de reformar [o serviço de segurança]”, disse William Taylor, atual encarregado de negócios da Embaixada dos EUA em Kiev e ex-embaixador na Ucrânia de 2006 a 2009, em entrevista recente à Rádio Free Europe. Taylor disse estar “cautelosamente otimista” sobre as chances de Zelenskiy, já que a agência se mostrou quase imune a mudanças no passado.
Taylor fez parte de um grupo consultivo internacional composto por representantes da União Europeia, da OTAN e dos Estados Unidos que participaram de uma reunião em 13 de agosto com o chefe do Serviço de Segurança, Ivan Bakanov, e o chefe do Conselho de Segurança e Defesa Nacional (NSDC), Oleksandr Danylyuk, para discutir a reforma a agência de segurança, que é conhecida pela sigla ucraniana SBU.
Danylyuk, ex-ministro das Finanças nomeado para o NSDC por Zelenskiy, disse ao Serviço Ucraniano da BBC antes da reunião que uma lei estava sendo finalizada para revisar o serviço de segurança para “tornar mais fortes suas funções centrais de contra-inteligência e combate ao terrorismo”.
“É muito importante que desta vez seja uma reforma bem-sucedida e eficaz”, disse Danylyuk, ressaltando o que chamou de “prioridade máxima” do governo Zelenskiy.”
[Fonte, 2019]
Sobre o trecho acima podemos derivar três reflexões:
1: A Rádio Free Europe — basicamente um veículo extra-oficial dos EUA, UE e OTAN — em sua linha editorial opta por afirmar claramente desde 2019 que a “reforma” do SBU deve ser a prioridade máxima do governo de Zelensky. A encarregada da embaixada dos EUA em Kiev afirma ser a eleição de Zelensky uma grande oportunidade para “reformar o SBU”.
2: Além disso, embora a publicação propositalmente faça menção ao fato de que “os investimentos estrangeiros são menores que poderiam pela reputação do SBU”, dando a entender que tal reforma seria para corrigir suas arbitrariedades e seu autoritarismo, a mesma publicação desmente isso ao afirmar que no bojo de tais aclamadas reformas o governo ucraniano estaria passando uma lei para “tornar mais fortes suas funções centrais de contra-inteligência e combate ao terrorismo”.
Ora, não sejamos tolos, nesse contexto, tal contra-inteligência seria empregada apenas contra a Rússia? De quem são os terroristas que falamos? Dmitri Kovalevich, jornalista ucraniano, em sua entrevista para A coisa pública brasileira no dia 5 de março, afirma que tais “terroristas”, alvos desta repressão, são majoritariamente pessoas de Donbass, cidadãos ucranianos que contestam o golpe de 2014, comunistas e socialistas da Ucrânia. Nesse sentido, EUA, UE e OTAN, a partir do que aqui foi exposto e analisado criticamente, não parecem se preocupar com os abusos e com o arbítrio do SBU, mas querem modernizar e aprimorar seus métodos, tornando-os mais imperceptíveis e tecnológicos.
3: Está exposto e dito diretamente que no dia 13 de agosto de 2019 aconteceu uma reunião entre burocratas e dirigentes da OTAN e a cúpula que comanda o SBU e o governo da Ucrânia para “discutir” as reformas no SBU. Evidentemente, o provável de ter ocorrido nessa “discussão” foi um “briefing” feito de cima para baixo por parte da OTAN, assinalando o que deveria ser feito pelo SBU.
Além disso, também é relevante ter em nota que no presente ano de 2022, no dia 14 de janeiro, o Estado de Minas, a partir de notícia da agência internacional pró-OTAN, AFP, demonstrou abertamente tal parceria, que parece ter sido formalizada nesse ano após a Ucrânia sofrer um suposto ataque cibernético:
“A Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) anunciou nesta sexta-feira (14) que assinará um acordo de cooperação cibernética com a Ucrânia, depois que um ataque deixou vários sites do governo fora de serviço, em um contexto de alta tensão entre Kiev e Moscou.
“Nos próximos dias, a Otan e Ucrânia assinarão um acordo sobre cooperação cibernética, incluindo o acesso da Ucrânia à plataforma de troca de informações sobre malware da Otan”, expressou Stoltenberg em um breve comunicado.
A União Europeia também prometeu mobilizar “todos os recursos” para ajudar seu aliado depois que o ataque afetou o funcionamento dos sites de vários ministérios. Entre os afetados, estão o das Relações Exteriores e o das Situações de Emergência. As autoridades ucranianas afirmam que não houve grandes danos e que a autoria do ataque não foi reivindicada até o momento.
Kiev não acusou ninguém, embora seus aliados ocidentais costumem acusar Moscou de promover ataques cibernéticos contra seus sites e infraestruturas, o que a Rússia nega.” [Fonte, 2022]
Nesse sentido, prosseguindo com nossa investigação, estabelecemos que: Nesta primeira parte, como método, em confluência com o que disse o jornalista brasileiro André Liohn sobre a supressão dos jornais e jornalistas na Ucrânia em benefício de mídias de propaganda oficial, observamos de forma crítica as mídias sociais do próprio SBU. Convém lembrar que desde 2016, a partir de um documento da Anistia Internacional, é comprovável a existência de ao menos 16 prisões especiais do SBU na Ucrânia, onde é reportada a ocorrência de largas violações aos direitos humanos*. Evidentemente, o SBU não publica sobre todas as prisões que efetua, portanto, o número de casos deve ser bem superior aos seis casos que nossa investigação conseguiu levantar apenas na página do SBU no Facebook.
Página oficial do SBU no Facebook: No dia 25 de fevereiro, logo após a entrada da Rússia no conflito civil ucraniano que já se arrasta desde o ano de 2014:

[Fonte, 2022]
Tradução: “Em Chernomorsk, em Odessa, a SBU deteve um sabotador pró-russo que desenhou rótulos especiais para o inimigo. Se notar pessoas tão suspeitas — ligue para o 102 ou para o Serviço de Segurança da Ucrânia na região de Ivano-Frankivsk através do número (0342) 52 22 95. Organize a prisão civil se possível. Se você viu etiquetas (cruz, círculo, etc.), pintado com tinta luminescente ou reflexiva, identifique onde eles estão.”
Comentário do autor: É possível perceber o processo de transformação de cidadãos ucranianos em “agentes alheios”, não ucranianos, mediante propaganda oficial, para justificar a supressão de suas liberdades. Isso é parte central da ideologia banderista. Deixam de ser considerados como ucranianos para seu Estado-Nacional, e agora são considerados sabotadores pró-russo. Assim não é necessário refletir: Se ele não é ucraniano, e se nenhum dissidente é tratado como ucraniano por lá, então a Ucrânia está unida em uníssono e resistência. A mera existência de tal cidadão, contudo, quebra essa narrativa. Por quais motivos esse cidadão ucraniano faria isso e se colocaria a sofrer tal risco?
Página oficial do SBU no Facebook: (2 de março):

Tradução: “SBU deteve um ajustador de alvos que disparou um ”calibre” russo no aeródromo de Ivano-Frankivsk. O Serviço de Segurança da Ucrânia, juntamente com a polícia e o Ministério Público especializado, detiveram um ajustador de alvos que disparou um calibre russo no aeródromo de Ivano-Frankivsk. O traidor da Ucrânia chegou a Ivano-Frankivsk em 22 de fevereiro. Ele se instalou em um motel perto do aeródromo. Em 23 de fevereiro, às vésperas do ataque de mísseis russos à Ucrânia, ele passou informações sobre a localização de uma instalação militar para a Rússia. Como resultado dos mísseis atingindo o aeródromo, sua infraestrutura foi destruída. Depois disso, o revisor relatou o resultado do ataque para a Rússia. O sabotador foi detido enquanto tentava cometer o próximo crime destinado a reduzir nossas capacidades defensivas. Ele será condenado a 15 anos de prisão sob o artigo “Traição.””
Comentário do autor: É possível perceber que tal cidadão preso foi chamado implicitamente de sabotador pró russo, e abertamente de traidor da Ucrânia, mas nunca do que de fato ele é: um cidadão ucraniano que preferiu, por algum motivo, cooperar com o invasor. Por que será que ele fez isso e correu tantos riscos?
Página oficial do SBU no Facebook — (7 de março):

Tradução: Na região de Ivano-Frankivsk, a SBU e a polícia da região de Ivano-Frankivsk detiveram um motorista com um arsenal de armas e munições. Mais de 2.000 cartuchos de munição, uma metralhadora, pistolas, lançadores de granadas, detonadores elétricos, granadas de TNT e componentes para diversos modelos de armas — tudo isso foi encontrado e confiscado pelos policiais do motorista do veículo. Os investigadores detiveram o réu na ordem processual. Atualmente, os policiais estão estabelecendo o paradeiro das armas e munições do suspeito. Em 6 de março, enquanto estavam de serviço em um posto de controle no distrito de Kolomyia, oficiais do departamento de polícia do distrito de Kolomyia, ao lado de oficiais da SBU, pararam um carro Lexus dirigido por um residente de Chernivtsi de 41 anos para verificar documentos. Os investigadores documentaram o crime e detiveram o arguido conforme o art. 208 do Código de Processo Penal da Ucrânia. Provas materiais foram apreendidas e encaminhadas para perícia. […] A polícia está investigando a origem das armas e munições apreendidas. Enfatizamos que o tempo de guerra exige métodos duros para a segurança dos cidadãos. Nas saídas e entradas de Ivano-Frankivsk e dos centros distritais, foram instalados postos de controle, onde policiais e militares estão de plantão 24 horas.
Comentário do autor: Embora existam poucas informações, é possível constatar sem erros que se trata novamente de um cidadão ucraniano cooperando com RPD, RPL ou com as forças russas. Em nenhum momento fora mencionado na publicação diretamente que tal pessoa se trata de um cidadão ucraniano, tampouco é feita a pergunta fulcral: Por que ele faria isso e correria tantos riscos?
Página oficial do SBU no Facebook: (07 de março):

Tradução: O Serviço de Segurança da Ucrânia e a polícia detiveram uma informante russa em Ivano-Frankivsk Uma residente de Kiev mudou-se para Prykarpattia em dezembro de 2021. Ela se estabeleceu perto de um aeródromo militar. A traidora estudou as rotas de decolagem e pouso, registrou em fotos e vídeos as partidas das aeronaves. Enviava os dados recebidos para a Federação Russa. Os investigadores da SBU informaram uma mulher de 48 anos de Kiev sobre suspeita de traição (Parte 1 do artigo 111 do Código Penal da Ucrânia). O cúmplice do cúmplice foi exposto sob orientação processual da Promotoria Regional de Ivano-Frankivsk. Os promotores pediram ao tribunal para mantê-la sob custódia.
Comentário do autor: Novamente podemos observar que a pessoa em questão é chamada “informante russa” e de traidora. Porém, se trata de uma cidadã ucraniana. O que quebra novamente o argumento de que não existem dissidentes ou militantes anti-governo. Será que todos eles atuam apenas por dinheiro? O que levou essa ucraniana de 48 anos a cooperar com RPD, RPL e a Rússia e se arriscar tanto?
Página oficial do SBU no Facebook: (15 de março):

Tradução: “O Serviço de Segurança da Ucrânia deteve um hacker que forneceu aos ocupantes comunicações móveis na Ucrânia. Com este colaborador, o inimigo: fez ligações anônimas da Rússia para os celulares dos invasores na Ucrânia; enviou SMS aos agentes de segurança e funcionários públicos ucranianos com propostas de rendição e do lado dos ocupantes; passou comandos e instruções para grupos avançados de invasores russos. Conforme o SBU, até mil ligações foram feitas por meio desse hacker em um dia. Muitos deles são da alta liderança do exército inimigo. O colaborador foi detido até agora, todo o seu equipamento foi confiscado. O agressor foi declarado suspeito. Ele será responsabilizado por toda a severidade da lei. Porque nele está o sangue de dezenas ou mesmo centenas de ucranianos mortos. Continuamos a trabalhar! Glória à Ucrânia!”
Comentário do autor: Tal cidadão é descrito apenas como um hacker ou um colaborador. Se trata, porém, muito provavelmente, de um cidadão ucraniano. Em tal publicação oficial do governo é possível observar o brado “Glória à Ucrânia”, sendo um grito de guerra comum entre neonazistas ucranianos, reforçando a interpretação de que o próprio SBU segue, de certa forma, a ideologia bandeirista. Afinal, porque esse cidadão julgou que valeria o risco se colocar contra seu governo?
Página oficial do SBU no Facebook: (25 de março):

[Fonte, 2022]
Tradução: “SBU expôs o agitador pró “restauração da URSS” em Ivano-Frankivsk. O habitante do centro regional nascido em 1978. Sob vários pseudônimos, fez campanha nas redes sociais “por uma URSS renovada”. Ele negou o fato do colapso da União Soviética e a legitimidade da declaração de independência das ex-repúblicas. Administrava canais do YouTube, perfis do Facebook e páginas do VKontakte onde era postado conteúdo destrutivo. Ele defendeu a ideia de “um povo ucraniano-russo”, a restauração de monumentos aos carrascos soviéticos e um retorno à constituição stalinista de 1936.
Em 24 de fevereiro, dia do início de um ataque russo em grande escala à Ucrânia, o réu enviou uma foto do ataque com foguete no aeroporto de Ivano-Frankivsk a um assinante com um número de operadora móvel russa. Com ele, ela discutiu o estado, a independência e a soberania da Ucrânia, bem como os eventos da guerra russo-ucraniana. Durante a busca, o SBU confiscou um passaporte de um cidadão da Federação Russa do apoiador da URSS, além do ucraniano.
Assim como equipamentos com indícios de atividades ilegais. A Procuradoria Regional de Ivano-Frankivsk está investigando os fatos revelados pelo Serviço de Segurança da Ucrânia, e a Procuradoria Regional de Ivano-Frankivsk está realizando a supervisão processual. Os agressores foram denunciados sob suspeita nos termos do art. 436 – 1 do Código Penal da Ucrânia. O “furo” aguarda o torcedor de 5 a 10 anos de prisão.”
Comentário do autor: Nessa publicação, tal cidadão é descrito como agitador pró-restauração da URSS. É importante notar que seus crimes se tratam de mera militância virtual e propaganda. Está constatado aqui o que nos afirmou Dmitri Kovalevich sobre a relação entre os ucranianos com ligações culturais com a Rússia e uma visão positiva sobre a memória coletiva da URSS:
“No caso do nosso conflito civil na Ucrânia podemos ver sim, a questão ideológica. A esmagadora maioria da região altamente industrializada de Donbass preserva principalmente sua mentalidade de classe e pró-soviética. Historicamente sendo trabalhadores de várias origens étnicas, eles resistem à política de estado mono étnico na Ucrânia e suas tentativas de revisionar os resultados da Segunda Guerra Mundial, visto que as autoridades de Kiev promovem oficialmente o culto de fascistas da Segunda Guerra Mundial e conduzem a política de descomunização (proibição de partidos comunistas, símbolos, materiais, postagens na internet, etc.).” [Fonte, 2022]
NAVEGANDO NOS COMENTÁRIOS DAS PUBLICAÇÕES DA SBU — EXISTE FASCISMO SEM BASE SOCIAL?
Diferente do que levam a acreditar em algumas análises, o fascismo, infelizmente, é um fenômeno de massas. Onde a burguesia, imbuída em urgência existencial reacionária, radicaliza de forma ilusória a classe trabalhadora para a contra-revolução, e não para a redenção. Nesse caso, existe a compreensão de que a classe trabalhadora ucraniana, como a brasileira em um período similar, sentia os limites do modelo econômico e do sistema político de seu país.
Contudo, não conseguia expressar isso de forma plenamente científica. A esquerda radical de tal país perdeu muita força após a dissolução da URSS. Mesmo com o lado pró-russo, isto é Ucrânia Oriental, tendo muitas pessoas simpáticas ao passado soviético, a maioria de tais pessoas votavam em figuras como Yanukovich, uma espécie de Renan Calheiros ucraniano, capaz dos piores arroubos de fisiologismo, porém não raro, de atitudes mais sensatas que seus igualmente fisiológicos colegas da política ucraniana.
Diferentemente do que alguns afirmam, Yanukovich era menos pró-Rússia, e muito mais pró-oligarquias ucranianas. Como no Brasil, Yanukovich, um gerente burocrata do capital, defendeu os interesses das oligarquias mais do que elas mesmas, que capitularam e o traíram. Quando decidiu pela Rússia e não pela UE no evento que desencadeou o golpe de 2014, Yanukovich não o fez por russofilia, mas por racionalidade burocrática.
A oferta da UE era pior e retiraria toda a soberania da Ucrânia, ao passo que a oferta da Rússia não era a melhor coisa do mundo, mas permitia alguma autonomia relativa. No entanto, ao recusar a proposta da UE, o político historicamente ligado à parte oriental da Ucrânia precipitou um golpe movido por interesses geopolíticos de União Europeia, OTAN e dos EUA que não aceitariam um não como resposta, e auxiliaram na intensificação de fissuras e contradições na sociedade ucraniana.
Os grupos neofascistas e neonazistas ao perceberem o vácuo pela debilidade da esquerda radical, o momento crítico e a frustração das massas diante das contradições e da guerra de propaganda que já existia, se lançaram como vanguarda da contra-revolução, e não demoraram a ganhar o status de heróis no ocidente. Na reabilitação da ideologia bandeirista, ofereceram uma nova utopia mórbida para as massas escolhidas, isto é, as do oeste, uma utopia supremacista, e calhou para os interesses dos EUA, OTAN e UE, e da oligarquia ucraniana que aceitou a submissão, e se associou a este projeto.
A meta do fascismo é precisamente a construção de um sistema tirânico, de um estado policial militarista altamente hierárquico, com o regime de trabalho acoplado ao capital internacional, com brutal repressão ao sindicalismo, proibições e censura contra a classe trabalhadora com o objetivo exclusivo de aumentar os lucros dos acionistas estrangeiros e dos oligarcas nacionais, definindo cidadãos de “primeira-categoria” de “segunda-categoria” a partir de critério sócio-econômico e étnico, relacionados a ideia de inimigo interno e inimigo externo como fator de mobilização de maiorias contra minorias.
Afinal, o sentido lógico do fascismo é a construção de um Estado-Nacional voltado para repelir a tomada do poder por parte da classe trabalhadora, para isso este precisa dividi-la, e historicamente o preconceito étnico-racial é a maior ferramenta para tal, o anti-comunismo também. Nesse sentido, é importante ver como os cidadãos ucranianos que seguem a página do SBU reagem e se relacionam com suas publicações. Como veremos adiante, alguns ucranianos do oeste costumam chamar os ucranianos com ligações culturais com a Rússia de “orcs”, para demonstrar como estes são considerados “cidadãos de segunda categoria” na Ucrânia e, para eles, menos que humanos.
Comentários na página oficial do SBU no Facebook: (2 de março)

Comentários na página oficial do SBU no Facebook: (7 de março)

Comentários na página oficial do SBU no Facebook: (15 de março)

Comentários na página oficial do SBU no Facebook: (15 de março)

Comentário do autor: Como é possível observar em tais comentários, além de ofensas racistas, como “orc”, reiterados pedidos por execução sumária e ofensas sexistas tais quais “vadia” nas publicações em que cidadãs ucranianas antigoverno aparecem, é notável que existe uma base social que fundamenta a atividade do SBU e se alimenta na propaganda do órgão de inteligência.
Isso, que parece ocorrer de tal forma desde 2014, funcionando a partir da associação entre a central de propaganda do SBU e outras mídias, consolida uma base de apoio da opinião pública, legitimando as ações autoritárias do SBU. Tal procedimento apenas parece ter sido o reforçado após a entrada formal da Rússia no conflito em 2022, notável pelos comentários raivosos clamando pela morte de qualquer um que possa ser identificado remotamente como “pró-russo”, mesmo sem um julgamento com provas cabais, apenas a partir de postagens no Facebook.
RELATOS DE REPRESSÃO E PRISÕES EFETUADAS PELO SBU EM JORNAIS UCRANIANOS:
Nesse sentido, prosseguindo com nossa investigação, estabelecemos que: Nesta segunda parte de nossa investigação, como método, procuraremos por informações adicionais em jornais da própria Ucrânia, portanto, teoricamente “insuspeitos”, que por acaso tenham vazado alguma informação relevante. Evidentemente, a mídia não publica sobre todas as prisões que o SBU efetua, portanto, o número de casos deve ser bem superior aos casos que nossa investigação conseguiu levantar apenas nos jornais que conseguimos acesso.
Consideremos que, se uma investigação virtual a partir do Brasil, país distante, consegue encontrar relatos reforçados por fontes insuspeitas de uma quantidade razoável de dissidentes presos, isso provavelmente significa que o número real de cidadãos antigoverno presos deva ser maior.
No dia 7 de março, (primeira oportunidade onde a ACPB encontrou esta fonte), por exemplo, o já referido jornal ucraniano, “comments.ua”, afirmou:
“Além disso, “Comentários” escreveu que o SBU informou sobre a detenção de colaboradores e cúmplices do inimigo. Conforme o Serviço de Segurança da Ucrânia, no último dia, policiais detiveram muitos sabotadores e cúmplices das tropas russas em 6 de março.”
[Fonte, 2022]
Devemos sempre nos recordar de observar de forma crítica, visto que a fonte é parcial, que as pessoas acusadas não passaram pelo devido processo legal e tais acusações muitas vezes carecem de provas, ou seja, é difícil saber se fizeram exatamente o que são acusadas de terem feito. O que sabemos ao certo é que foram presos, e parecem tratar-se de cidadãos ucranianos contra o seu governo. Aprofundando a mesma notícia, o já referido jornal ucraniano, “comments.ua”, noticiou:
“A SBU relatou a detenção de colaboradores e cúmplices do inimigo — O Serviço de Segurança da Ucrânia detém pessoas que cooperam com o inimigo:
7 de março de 2022, 13:00 comentários 1107 — Autor: Kozlova Albina.
Conforme o Serviço de Segurança da Ucrânia, no último dia, policiais detiveram muitos sabotadores e cúmplices de tropas russas no dia 6 de março. A SBU relatou a detenção de colaboradores e cúmplices do inimigo.Na região de Donetsk, o SBU deteve 13 militantes da pseudo-república da RPD, que dispararam contra civis, conjuntos habitacionais e infraestruturas críticas em Mariupol, Kramatorsk, Volnovakha, Sartan e Talakivka. Os detidos reagiram e dispararam contra as tropas ucranianas perto da aldeia de Mayorsk. Lá eles foram feitos prisioneiros durante a batalha.
Em Kiev, o SBU deteve um agente de inteligência russo. O homem trabalhava como diretor em uma empresa de defesa no Dnipro, que fornecia software para drones. O detido disse à SBU que recebeu a tarefa do GRU da Federação Russa de transferir dados sobre o exército da Ucrânia na área de realização de OOS. Foi instaurado um processo ao abrigo dos artigos 2.º do artigo 258.º-5, parte 1 do artigo 258.º-3, parte 1 do art. 111.º do Código Penal. O detido foi informado da suspeita de traição.
Em Nikolaev dois cúmplices do inimigo que informaram ocupantes de objetos militares da cidade, infraestrutura, movimento de divisões de ZSU em Nikolaev, funcionários da polícia nacional, os serviços especiais ucranianos, colocação de postos de controle e forças de defesa foram detidos.
Em Rivne, o SBU deteve um residente-assistente local das forças de ocupação russas, que informou sobre o transporte do exército, instalações militares nas cidades da região de Rivne. Um processo criminal foi aberto em Lugansk oblast contra um ex-membro do Partido das Regiões que quer chefiar a administração da ocupação na cidade temporariamente ocupada de Belovodsk.
Em 2014, o colaborador organizou um falso “referendo” na região de Lugansk e ocupou o cargo do chamado “Ministro da Agricultura da República Popular de Lugansk”. O suspeito continua a “trabalhar” no inimigo e no território temporariamente ocupado em Belovodsk.” [Fonte, 2022]
Mesmo de um país distante como o Brasil, é possível conseguir a informação de dezenas de prisões. Uma única matéria desse tipo coloca em cheque toda a percepção falsamente construída de que existe meramente uma oposição entre a Ucrânia e Rússia, e nos traz a tona um ambiente que parece ser de guerra-civil, com muitos dissidentes sendo presos.
Vai totalmente contra, também, o mito de “resistência uníssona” ucraniana. Pelo contrário, mesmo com censura, repressão e um ambiente hostil, ao que parece não foi pequeno o número de pessoas que assumiram riscos de “cooperar com o invasor” e com RPD e RPL, agindo contra o governo sediado em Kiev e contra o próprio estado de coisas no país desde 2014.
Evidentemente, os veículos pró-Ucrânia, como o perfil de propaganda do SBU, ou as mídias do batalhão Azov, repetem a tese de que estes agiram apenas por dinheiro, revivendo o orientalismo, a russofobia ao lado de sua ideologia banderista, etnocêntrica e supremacista europeia, com retoques de conspirações da Guerra Fria, quanto ao famigerado “ouro de Moscou”.
É nesse sentido que devemos observar a matéria abaixo publicada no dia 6 de março, pelo já referido jornal ucraniano “comments.ua”:
“Agentes agressores tentaram criar uma “República Federal da Ucrânia” — Agente russo detido por funcionários do Serviço de Segurança da Ucrânia.
6 de março de 2022, 11:52 Autor: Kozlova AlbinaA SBU contou como o agente do Kremlin foi detido. Graças à detenção, soube-se que Moscou planejava criar novas “repúblicas populares” no território da Ucrânia ocidental. Isto foi relatado pelo serviço de imprensa do Serviço de Segurança. Agentes agressores tentaram criar uma “República Federal da Ucrânia”.
SBU deteve um homem suspeito de atos ilegais:Sabe-se que o agressor planejava criar uma “República Federal da Ucrânia” em regiões como Ivano-Frankivsk, Transcarpathian, Lvov, Ternopil, Chernivtsi. Assim, com a ajuda de agentes inimigos, foi planejado que a RPD tomaria o poder nas áreas de retaguarda.
“A lógica de criar uma pseudo-formação é minar a situação na retaguarda dos militares ucranianos. Ou seja, nas áreas que não podem ser capturadas pelas forças do exército regular da Federação Russa. Conforme o plano dos ocupantes, a criação de uma pseudo-república privaria as Forças Armadas da Ucrânia de apoio e apoio da retaguarda”, diz o relatório.
Sabe-se que o organizador e pessoas-chave da rede de inteligência inimiga na região de Ivano-Frankivsk foram detidos. Essas pessoas devem recrutar quase meio milhar de traidores no território da Ucrânia, que receberam armas e a tarefa de destruir autoridades locais e tomar administrações, além de atacar representantes de agências de aplicação da lei. Depois disso, planeja-se proclamar pseudo-repúblicas para que se submetessem ao agressor.“O SBU encontrou manifestos prontos do organizador para o exército, forças de segurança e população civil da Ucrânia com apelos para passar para o seu lado. Além disso, foi encontrado um apelo aos estados estrangeiros exigindo o reconhecimento do novo ‘enclave’”, diz a mensagem.
Atualmente, os detidos deram provas, as ações investigativas estão em andamento. Conforme o artigo 109 (ações destinadas a alterar ou derrubar à força a ordem constitucional, ou tomar o poder do Estado) do Código Penal, os traidores podem pegar 10 anos de prisão.”
[Fonte, 2022]
É possível observar que tais operações de repressão, prisão, propaganda e censura já ocorrem desde o início do conflito, retratadas em jornais ucranianos pelo menos desde o início do mês. Vejamos uma matéria publicada no dia 4 de março, pelo já referido jornal ucraniano “comments.ua”, publicada no dia 6 de março:
“SBU continua a deter agentes inimigos e traidores: SBU anuncia a detenção de cúmplices de tropas russas inimigas.
4 de março de 2022, 18:57 Autor: Kozlova Albina
O serviço de imprensa do Serviço de Segurança da Ucrânia informa que em 4 de março foi detido um traidor que ajudou os invasores a bombardear o aeródromo militar de Lutsk.
Sabe-se que o homem recebeu e transmitiu aos serviços especiais russos dados sobre os tipos e número de aeronaves militares, suas localizações, voos de treinamento, dados pessoais de militares no aeródromo. A partir de suas dicas, o aeródromo recebeu disparos de mísseis. O suspeito relatou aos “curadores” sobre o “trabalho” realizado.
O homem estava transmitindo informações sobre operações militares ao inimigo durante os dias 24 e 28 de fevereiro. Um homem que trabalhava com os invasores foi informado de suspeita nos termos do artigo 111 do Código Penal da Ucrânia (alta traição), sendo preso.Na região de Lugansk, o SBU abriu um caso contra o militante da “LPR”. O homem, ao lado dos ocupantes, chegou a Belovodsk e se proclamou chefe da administração civil-militar.
O homem proclamou o território da cidade como parte da pseudo-república da LPR e convocou os moradores locais e policiais a apoiar as tropas russas. Atualmente, as investigações pré-julgamento estão sendo realizadas segundo a Parte 1 do artigo 109 do Código Penal da Ucrânia.
Na região de Vinnytsia, funcionários da SBU encontraram um esconderijo de armas e explosivos em um cinturão florestal da região. Havia quase 2 kg de TNT e plastid, 10 granadas RGD e F1 com fusíveis, um tambor cheio de cartuchos para armas pequenas automáticas, granadas para um lançador de granadas sob o cano.
Na região de Dnipropetrovsk, o SBU deteve um cúmplice dos serviços especiais russos que estava espalhando propaganda do “mundo russo” e aprovando a agressão russa contra a Ucrânia. Nas suas mensagens, justificou os crimes dos invasores, foi informado da suspeita de cometer crimes graves e especialmente graves ao abrigo do n.º 2 do art. 437.º e do n.º 1 do artigo 263.º do Código Penal.
Na região de Cherkasy, foi denunciado um agitador inimigo, que espalhou propaganda do país agressor e pânico nas redes sociais, disseminou fakes sobre as atividades das autoridades estatais e apresentou dados distorcidos sobre o estado militar. Contra ela foi instaurado um processo-crime ao abrigo do n.º 1 do artigo 161.º do Código Penal e foi informada da suspeita da prática de um crime.”
[Fontes, 2022]
Além disso, é digno de nota que o SBU prendeu de forma ilegítima e absurda, no domingo dia 6 de março, o primeiro secretário da União da Juventude Comunista Leninista da Ucrânia, Mikhail Kononovich, e seu irmão Aleksander, ambos membros ativos do Comitê Antifascista do país do leste europeu. Sobre isso informou o jornal brasileiro“ Hora do Povo”:
“Frente ao risco do que pode ocorrer nas próximas horas, a Federação Mundial das Juventudes Democráticas (FMJD), “chama as suas organizações membros e aos jovens e povos de todo o mundo a denunciarem esta situação, exigir sua liberdade e a protestar contra o regime neofascista ucraniano para que mediante esta pressão consigamos deter seu assassinato.”
Os temores de um possível assassinato têm inúmeras razões, alertam. No último domingo foi informado que os agentes do SBU haviam executado o banqueiro Denis Kireyev, membro da equipe de negociação ucraniana, após ter participado da primeira roda de conversações. Segundo o serviço secreto, existiam evidências “claras” de alta traição, por isso foi morto.
No começo da semana passada, Vlodymyr Struk, prefeito da cidade de Kreminna foi abatido com um tiro no coração, logo após ser sequestrado de sua casa. Um pouco antes de ser fuzilado, o prefeito foi acusado de “traidor” e julgado por um suposto tribunal “popular” — pró EUA. Conforme publicou no Twitter o ministro do Interior da Ucrânia, Anton Gerashchenko, “foi um traidor a menos.””
[Fonte, 2022]
Afinal, quem eram esses jovens presos com tanta virulência pelo SBU? Eram perigosos agentes russos militarizados? O jornal “Hora do Povo” trouxe mais informações sobre isso que nos ajudam, ao menos nesse caso particular, a ter uma noção mais completa quanto à validade dos argumentos para tal ato de arbítrio. Que nossos leitores façam seu próprio juízo sobre a validade e tais prisões:
“Como integrantes do Comitê Antifascista da Ucrânia, Mikhail e Aleksander participaram de protesto da UJCLU em frente à embaixada dos Estados Unidos na capital, Kiev, no dia 16 de fevereiro, condenando a submissão do presidente Volodymyr Zelensky ao expansionismo imperialista.
Na oportunidade já haviam sido agredidos e capturados por neonazistas dos grupos C14 e Corpo Nacional. Segundo o SSU, os irmãos Kononovich foram colocados atrás das grades em Kiev por serem propagandistas da Rússia e da Bielorrússia, e agirem para desestabilizar a situação interna da Ucrânia, criando um “cenário de informações necessárias” para o inimigo.
[…] Membro da FMJD, a organização comunista realizou recentemente a campanha “Komsomol pela Paz!”, pressionando para que a Ucrânia corte relações com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e resolva pacificamente o conflito com o país vizinho.
A entidade também se somou à campanha internacional pela libertação do jornalista Julian Assange, fundador do Wikileaks, detido na Inglaterra e requisitado pela justiça dos Estados Unidos, que pretende julgá-lo por acusações de suposta “espionagem”.”
[Fonte, 2022]
Como é possível observar, analisando de forma crítica tanto a primeira quanto a segunda parte de nossa investigação, algo se torna claro. É impossível distinguir se as causas das prisões são verídicas, contudo, fica claro que existem cidadãos ucranianos dissidentes contra o governo de seu país. Além disso, é impossível não ter a impressão de que estes são reportados, ainda que indiretamente, em um número grande nas mídias ucranianas, seja em mídias de propaganda governamental como a página do SBU no Facebook, ou meios de mídia formais fazendo propaganda governamental indireta, como o próprio site “comments.ua”.
Observação:
Por curiosidade, se não existirem pessoas sendo contabilizadas duas vezes, neste presente artigo foram citadas 27 prisões efetuadas pelo SBU desde o dia 25 de fevereiro. Todas elas noticiadas, seja na mídia oficial de propaganda do SBU ucraniano no Facebook, ou nas mídias ucranianas convencionais utilizadas (comments.ua).
SOBRE AS LEIS DE REPRESSÃO A “COLABORADORES DA RPD, RPL E RÚSSIA” BAIXADAS NO DIA 15 DE MARÇO:
Como podemos ver anteriormente, a repressão, as prisões e a censura, que já existiam antes da entrada da Rússia no conflito, parecem ter aumentado, ao menos em exposição na mídia. Nesse sentido, é observável que antes do dia 15 de março, uma série de cidadãos ucranianos anti-governo foram presos e responderam acusações relativas a figuras jurídicas já existentes no código penal ucraniano. Contudo, no dia 15, no sentido de legitimar e formalizar tais prisões e tal sistema policialesco, o governo ucraniano baixou uma série de leis e decretos sobre a colaboração de seus cidadãos com RPD, RPL e com a Rússia. Sobre isso, nos afirmou o jornal ucraniano “comments.ua” :
“O presidente assinou leis sobre responsabilidade pelo colaboracionismo. Colaboração será punida de acordo com mudanças no Código Penal.
15 de março de 2022, 14h36 Autor: Kozlova AlbinaO chefe de Estado já assinou duas leis anteriormente aprovadas pelo parlamento sobre a punição do colaboracionismo. Estamos falando sobre a lei №5144 “Sobre alterações a certos atos legislativos (sobre o estabelecimento de responsabilidade criminal por atividades colaborativas)”, disse o vice-presidente da Verkhovna Rada Oleksandr Kornienko.
Os documentos serão publicados e implementados em breve. As atividades de colaboração incluem: negação pública de agressão armada contra a Ucrânia por um cidadão da Ucrânia, estabelecimento e aprovação da ocupação temporária de parte da Ucrânia ou apelos públicos por um cidadão da Ucrânia para promover o inimigo, cooperação, não reconhecimento da soberania ucraniana sobre o território temporariamente ocupado.
Tais ações são puníveis com a privação do direito de exercer determinados cargos ou exercer determinadas atividades por um período de 10 a 15 anos.— Para propaganda de cooperação e aprovação da agressão da Rússia contra a Ucrânia em instituições educacionais e implementação de padrões educacionais do estado agressor, os cidadãos serão punidos com trabalho correcional por até 2 anos, ou prisão por até 6 meses, ou prisão por até três anos -15 anos.
— A transferência de recursos materiais para o inimigo é punível com multa até dez mil rendimentos mínimos não tributáveis ou prisão por um período de 3 a 5 anos com privação do direito de exercer determinados cargos, ou exercer determinadas atividades por um período determinado do 10 a 15 anos e com confisco de bens.
— A participação em atividades políticas da potência ocupante e a sua organização, conduta, atividades de informação em cooperação com o inimigo é punível com pena de prisão de 10 a 12 anos com privação do direito de exercer determinados cargos ou exercer determinadas atividades por dez a quinze anos e confisco de bens ou sem. Você pode ler mais sobre a lei e as sanções aqui.”
[Fonte, 2022]
A coisa pública brasileira conseguiu acesso ao documento oficial[3] na íntegra e disponibiliza a tradução dos pontos mais relevantes de tal documento, cujo original está presente na íntegra no final do artigo, logo abaixo:
“1. Negação pública de agressão armada contra a Ucrânia por um cidadão da Ucrânia, estabelecimento e aprovação de ocupação temporária de parte do território da Ucrânia ou apelos públicos de um cidadão da Ucrânia para:
1) apoio às decisões e/ou ações do Estado agressor, grupos armados e/ou a administração de ocupação do estado agressor;2) cooperação com o Estado agressor, grupos armados e/ou a administração da ocupação do estado agressor;
3) não reconhecimento da extensão da soberania estatal da Ucrânia sobre territórios ocupados da Ucrânia,— será punível com privação do direito de exercer determinados cargos ou exercer determinadas atividades por um período de dez a quinze anos.
2. Ocupação voluntária por um cidadão da Ucrânia de um cargo não relacionado desempenho de funções organizacionais-administrativas ou administrativa econômicas em autoridades ilegais estabelecidas no território temporariamente ocupado, inclusive na administração de ocupação do estado agressor,— será punível com a privação do direito de exercer determinados cargos ou exercer determinadas atividades por um período de dez a quinze anos, com ou sem confisco de bens.
3. Implementação de propaganda por um cidadão da Ucrânia em instituições educacionais, independentemente dos tipos e formas de propriedade, a fim de facilitar a agressão armada contra a Ucrânia, estabelecer e aprovar a ocupação temporária de parte da Ucrânia, evitar a responsabilidade pela agressão do estado agressor contra a Ucrânia, bem como ações de cidadãos ucranianos para implementar padrões educacionais. O agressor em tais instituições de ensino,— será punível com trabalho correcional até dois anos ou prisão até seis meses, ou prisão até três anos com privação do direito de ocupar determinados cargos, ou exercer certas atividades por dez a quinze anos.
4. Transferência de recursos materiais para armadas ou paramilitares ilegais, formação estabelecida no território temporariamente ocupado e/ou formação armada ou paramilitar do Estado agressor, e/ou exercer atividades econômicas em cooperação com o estado agressor, autoridades ilegais estabelecidas no território temporariamente ocupado, incluindo a administração de ocupação do estado invasor,
– é punível com multa até 10.000 rendimentos mínimos isentos de impostos ou prisão por um período de três a cinco anos com privação do direito de exercer determinados cargos, ou exercer determinadas atividades por um período de dez a quinze anos e confisco de propriedade.
5. Ocupação voluntária por um cidadão da Ucrânia de um cargo relacionado a exercer funções organizacionais ou administrativas ou econômicas em autoridades ilegais estabelecidas no território ocupado temporariamente, incluindo a administração de ocupação do Estado agressor, ou eleição voluntária para tais órgãos, bem como participar na organização e realização de eleições e/ou referendos ilegais no território temporariamente ocupado, ou chamadas públicas para tais eleições ilícitas e/ou referendos nos territórios temporariamente ocupados,— É punível com prisão por um período de cinco a dez anos com privação do direito de exercer determinados cargos ou exercer determinadas atividades por um período de dez a quinze anos e com ou sem perda de bens.
6. Organização e realização de eventos políticos e/ou realizar atividades de informação em cooperação com o estado agressor e/ ou sua administração de ocupação, visando apoiar o estado agressor, sua administração de ocupação ou formações armadas e / ou sua evasão de responsabilidade por agressão armada contra a Ucrânia, na ausência de sinais de traição, participação ativa em tais atividades,
— É punível com pena de prisão de dez a doze anos com privação do direito de exercer determinados cargos ou exercer determinadas atividades por um período de dez a quinze anos e com ou sem confisco de bens.
7. Ocupação voluntária de cargos ilegais por um cidadão da Ucrânia órgãos judiciais ou de aplicação da lei estabelecidos no território temporariamente ocupado, bem como a participação voluntária de um cidadão da Ucrânia em formações armadas ou paramilitares ilegais estabelecidas no território temporariamente ocupado e / ou nas forças armadas do estado agressor ou fornecendo tais formações em operações de combate Forças da Ucrânia e outras formações militares formadas conforme as leis da Ucrânia, formações voluntárias formadas ou auto-organizadas para proteger a independência, soberania e integridade territorial da Ucrânia,— é punível com pena de prisão de doze a quinze anos com privação do direito de exercer determinados cargos ou exercer determinadas atividades por um período de dez a quinze anos e com ou sem perda de bens.
8. Cometer pelas pessoas especificadas nas partes cinco a sete deste artigo, ações ou decisões que levaram à morte de pessoas ou outras consequências graves,— é punível com prisão por um período de quinze anos ou prisão perpétua com privação do direito de exercer determinados cargos ou exercer certas atividades por um período de dez a quinze anos e com ou sem confisco de bens.” [Fonte, 2022]
Como é possível observar, tais leis são por muito ambíguas, e dão a possibilidade da punição para uma série de pessoas, sem um julgamento, às vezes por motivos fúteis. Apenas a negação do discurso oficial de invasão da Ucrânia, pode acarretar ambígua punição: “será punível com privação do direito de exercer determinados cargos ou exercer determinadas atividades por um período de dez a quinze anos.”
Ora, de quais cargos tratamos? Todos os cargos públicos, por exemplo? Quais atividades estão sendo mencionadas? O ato de votar é uma delas, ou outras expressões de direitos políticos figuram nessas atividades? Tal dificuldade na interpretação da lei, não parece ser por acaso, mas, pelo contrário, para dar espaço e brechas para a repressão ser “criativa” em suas punições. Em suma, continuam com a barbárie, mas com legitimidade e formalizando um mínimo de resguardo jurídico na esfera internacional para uma prática já corriqueira no país desde 2014 [4].
Pela linguagem ambígua e morosa, poderia passar despercebido, mas devemos analisar atentamente com o foco e a atenção no item número 6:
“6. Organização e realização de eventos políticos e/ou realizar atividades de informação em cooperação com o estado agressor e/ ou sua administração de ocupação, visando apoiar o estado agressor, sua administração de ocupação ou formações armadas e / ou sua evasão de responsabilidade por agressão armada contra a Ucrânia, na ausência de sinais de traição, participação ativa em tais atividades,
— é punível com pena de prisão de dez a doze anos com privação do direito de exercer determinados cargos ou exercer determinadas atividades por um período de dez a quinze anos e com ou sem confisco de bens.“
Tal lei é ambígua e pode, sob certa flexibilidade hermenêutica, isto é, da interpretação por parte do juiz, acabar por criminalizar qualquer ato político anti-governo com penas duríssimas, como de dez a doze anos de prisão e o confisco de seus bens. Além disso, é sempre importante nos questionarmos: Porque o governo faria uma lei como essa se a existência de dissidentes anti-governo não fosse um problema concreto e disseminado?
SOBRE A PERSEGUIÇÃO POLÍTICA E A PROIBIÇÃO DOS PARTIDOS POLÍTICOS:
Conforme relatado pelo jornalista ucraniano Dmitri Kovalevich[5], após o golpe de 2014 a Ucrânia proibiu a representação de símbolos comunistas, socialistas, marxistas e soviéticos. Se isso soaria absurdo no Brasil, imaginem então na Ucrânia, um país cujos símbolos pertencem a sua história e, embora não seja unanimidade, representam algo positivo para um número razoável de ucranianos até os dias de hoje. Como contrapartida, constava na mesma lei a proibição do nazismo[6]. Contudo, não foi o que ocorreu, como é possível observar em uma série de documentos presentes aqui mesmo na A coisa pública brasileira, e na entrevista que realizamos com Dmitri Kovalevich.
Para ficar claro o que ocorreu a todo brasileiro: A proibição formal do nazismo esbarrou no fato de que, na Ucrânia, o movimento neonazista cultua figuras próprias, como tropas ou líderes nacionais que colaboraram com nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Estes não foram proibidos dada a força política da extrema-direita, que conta com base social. No Brasil, Bolsonaro e seus filhos tentaram fazer a mesma coisa[7]. Lançaram uma lei para proibir “nazismo” e “comunismo”, equiparando ambos absurdamente.
No fim das contas, sabemos muito bem que o comunismo e o socialismo seriam proibidos por aqui, caso isso tivesse ido adiante, mas figuras abjetas nacionais como Plínio Salgado, Ustra e outros tranquilamente poderiam servir aos mesmos propósitos, cultuados — como o são em determinados círculos —, onde a mesma ideologia continuaria a operar e batalhar pela tomada completa do poder.
Tudo isso sob o disfarce da ilusória capa da neutralidade que combate os supostos “dois extremos”. Sobre situações assim, nos diria o brilhante marxista, o general brasileiro Nelson Werneck Sodré em seu livro “Capitalismo e Revolução Burguesa no Brasil”, no capítulo sobre os conceitos de “populismo” e “totalitarismo”, disponível na A coisa pública brasileira:
“Entre eles (artifícios da reação), e com destaque, em determinada fase, certa virulência crítica que se marcava pela negação de valores até si aceitos. Outro disfarce foi aquele de apresentar uma posição mais à esquerda do que a esquerda conhecida e identificada, para dar duto combate a essa. Uma posição de ultra-esquerda foi o disfarce mais comum que a reação assumiu em certo tempo.
Claro que, ainda aqui, há que ressalvar aqueles que assim procediam por honesto propósito, ainda que ingênuo, de fazer uma revolução verbal onde não havia condições para uma revolução real. Uma das ambiguidades conferidas por esse disfarce foi o de exorcizar o que apelidaram de “Totalitarismo”. O conceito, cuja confusão era adrede explorada, escondia a verdade, mas não esconda a ambiguidade.
Aquele que afirmara combater o “Totalitarismo” tornava idênticos, para os efeitos a que se propunha, o socialismo o fascismo. Ao nível ainda inferior, mais infeliz embora menos pretensioso, colocava-se aquele que, no aceso da luta ideológica, particularmente face à repressão vesânica, dizia-se do certo, isto é, nem da esquerda, nem da direita.””
Nelson Werneck Sodré, “Capitalismo e Revolução Burguesa no Brasil”.
Não é de se espantar, portanto, que durante o escalonamento do conflito, com a entrada da Rússia, tal tendência tenha se intensificado. Se utilizando do entendimento conferido pela própria “lei anti-colaboração” anteriormente citada no dia 20 de março, foram suspensos 11 partidos políticos na Ucrânia. O argumento para tal disparate, claro, foi o de que todas essas agremiações políticas seriam “pró-Rússia”. Sobre isso, nos relata o portal de notícias do UOL:
“O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse hoje que instruiu seu governo a suspender a atividade de 11 partidos políticos que, segundo ele, têm “laços” com o governo da Rússia.
Em discurso divulgado neste domingo (20) em sua página no Telegram, Zelensky afirmou que o Conselho de Segurança e Defesa Nacional da Ucrânia decidiu suspender a atividade dos partidos sob a lei marcial — que está em vigor desde o início dos ataques em 24 de fevereiro, e será prorrogada mais uma vez até o dia 26 de março.
[…]
Veja lista completa dos partidos: Bloco de Oposição; Partido da Sharia; Nosso; Oposição de Esquerda; União das Forças de Esquerda; Partido do Estado; Partido Socialista-Progressista Ucraniano; Partido Socialista da Ucrânia; Socialistas; Bloco Vladimir Saldo; e Plataforma de Oposição Pela Vida.
Zelensky disse que o Ministério da Justiça foi “instruído a tomar imediatamente medidas abrangentes para proibir as atividades desses partidos políticos da maneira prescrita”. No início de fevereiro, antes do início da invasão em larga escala da Rússia pela Rússia, Zelenskyy havia desligado três redes de televisão que, segundo ele, espalhavam “propaganda” financiada pelo Kremlin.
Com a prorrogação da lei marcial anunciada hoje, todos os homens de 18 a 65 anos não poderão sair da Ucrânia, salvo raríssimas exceções.
Outra determinação divulgada neste domingo pelo presidente ucraniano é a unificação de todos os canais de televisão em uma única “plataforma de comunicação estratégica” para fazer com que as emissoras fiquem ativas 24 horas.”
Sobre o trecho acima podemos derivar duas reflexões:
1: Como pudemos analisar, quando observamos a lista de tais 11 partidos banidos ou suspensos, muito embora o argumento para tal seja o de relação com a Rússia — e que ao menos um de tais partidos seja liderado por um oligarca com relações com Moscou —, fica claro que a maioria destes não parece ser necessariamente pró-Rússia, e sim anti-governo.
2: Em linha com o que afirmou o jornalista brasileiro André Liohn, correspondente do UOL e da Folha de São Paulo na Ucrânia, o governo da Ucrânia parece ter concluído um movimento rumo a unificação interna de narrativa e otimização de difusão de propaganda, após ter banido 3 canais de TV antes mesmo da entrada da Rússia no confronto, no dia 20 de março também unificou todos os canais de Televisão.
Da mesma forma que a mídia tem que ser única, e emular a mesma narrativa da propaganda oficial, um processo de natureza análogo parece ser verificado na política. Isto é, qualquer opinião contrária à posição oficial, ou à “posição oficialmente aceita” (bandeirismo), é descredibilizado, tida como pró-russa, interditada e censurado.
Observando o banimento dos partidos de forma crítica podemos pensar: A política burguesa prima pelo princípio da representação. Nesse sentido temos no parlamento um local onde parlamentares representam grupos ou classes sociais. De tal sorte, o banimento do que havia restado da centro-esquerda e outras formas de oposição ao governo, acabou por criar um sistema político onde apenas ultra-liberais aliados aos EUA, a OTAN e a extrema-direita supremacista étnica e chauvinista coexistem e participam.
Tal corte serve para entender quais são as forças que podem atuar politicamente nesse momento na Ucrânia: O imperialismo atrelado aos países centrais, no poder desde 2014 por intermédio da oligarquia submissa local — EUA, UE, seus aliados minoritários, e sua polícia do mundo, a OTAN, cuja função pós-guerra-fria reprimiu e abrir novos mercados em nome dos países centrais e do lucro das multinacionais, do domínio geopolítico em benefício do ocidente geopolítico (do qual nós brasileiros não fazemos parte) — que financia milícias paramilitares extremistas, grupos políticos e partidos de extrema-direita na Ucrânia, de uma ideologia neonazista específica, o bandeirismo. A extrema-direita na Ucrânia, portanto, nada mais seria do que os cães de guarda e vanguarda radical do imperialismo dos países centrais. Argumentos que o sistema político formado após o banimento representa perfeitamente isso.
SOBRE A REPRESSÃO DE DISSIDENTES MEDIANTE PROIBIÇÃO DE SÍMBOLOS E A PERSEGUIÇÃO RELIGIOSA FORMALMENTE LEGALIZADA NA UCRÂNIA:
Como noticiado pela mídia da Ucrânia desde o dia 27 de março, o governo prepara uma lei para criminalizar e prender qualquer um com um símbolo que remeta a Rússia, a RPD ou RPL. Isso, claro, como comentado anteriormente, é apenas a formalização para algo que já ocorre desde o começo do conflito. Talvez uma forma de se proteger de problemas jurídicos com o aproximar do fim da contenda. É interessante ver como os jornais locais tratam as questões. Diz o jornal ucraniano “comments.ua”:
“No site da Verkhovna Rada, um projeto de lei “Sobre a proibição de propaganda do regime totalitário neonazista russo, um ato de agressão contra a Ucrânia pela Federação Russa como um estado terrorista, símbolos usados por armadas e outras formações militares da Federação Russa na guerra contra a Ucrânia” n.º 7214 de 26 de março de 2022.
O deputado do povo Palavroso Zheleznyak anunciou a apresentação de um projeto de lei para proibir o símbolo que os ocupantes pintam em seus equipamentos militares.
“Na Lituânia, na República Tcheca e na Baviera alemã, eles já começaram a equiparar o símbolo “Z” com a suástica nazista. Hoje estou apresentando um projeto de lei ao parlamento ucraniano. Agora, para o uso público do símbolo da Rússia exército invasor, o signo “Z”, será preso. De cinco a dez anos com confisco de bens”, escreveu.”
[Fonte, 2022]
Como interpretar, senão como uma forma de justificar e legitimar a prisão de pessoas que são, por bons motivos e há muitos anos, contra o governo? Ademais, por qual motivo aprovar uma lei como essa, se “não existem dissidentes contra o governo”, e a “resistência ucraniana é uníssona”? Outrossim, existe também perseguição religiosa escancarada na Ucrânia nesse momento sendo formalizada na Verkhovna Rada, o parlamento local:
“Além disso, os deputados do povo registraram um projeto de lei “Sobre as Emendas à Lei da Ucrânia “Sobre a Liberdade de Consciência e Organizações Religiosas” sobre a proibição das atividades de organizações religiosas (associações) que fazem parte da estrutura (que faz parte) de uma organização religiosa (associação), cujo centro principal (gerenciamento) está localizado fora da Ucrânia, em um estado reconhecido por lei como tendo cometido agressão militar contra a Ucrânia e / ou ocupado temporariamente segmento do território da Ucrânia.” N.º 7213.” Os textos dos projetos de lei ainda não foram publicados. Lembre-se que o presidente assinou leis sobre responsabilidade pelo colaboracionismo.”
[Fonte, 2022]
Evidentemente, trecho acima escancara a perseguição a matrizes religiosas da Rússia e Bielorrússia que por ventura existam na Ucrânia.
CONCLUSÃO — SOBRE A CONSTRUÇÃO DO MITO DE “RESISTÊNCIA UNÍSSONA” UCRANIANA MOLDADO A PARTIR DA REPRESSÃO, CENSURA E PROPAGANDA:
Após uma extensa análise e reflexão apresentada nesta investigação jornalística e presente artigo, parece difícil chegar a outra conclusão que não o óbvio. O mito da “resistência uníssona” ucraniana, é, pois, isso mesmo, um mito. E como todo mito, parte de um fato histórico operado por quem consegue reescrever a história na dialética da lembrança x esquecimento. Nesse caso em particular, como já apontado anteriormente no artigo publicado na A coisa pública Brasileira sobre a batalha de Mariupol, referente as bases da ideologia extremista de direita na Ucrânia:
“[Para eles] é uma guerra anti-Rússia e russos, em uma manipulação da memória da antiga relação do povo ucraniano com o Império Russo para gerar um sentimento de revolta. Esta é a memória particular da “Guerra Sagrada” corrompida para as milícias de extrema-direita na Ucrânia. Além disso, a partir do ponto de vista de Bandeira e seus homólogos, também são anti-União Soviética, contra seus apreciadores e tudo o que ela representou, pois, esta foi, segundo eles, apenas uma artimanha para “russos e demais minorias ideologicamente “internacionalistas” tomarem seu país”. Temos como as milícias da extrema-direita na Ucrânia compreendem sua “Guerra Popular” corrompida desde 2014.”
[Fonte, 2022]
Nesse sentido, o mito da “resistência uníssona” ucraniana, difundido e reproduzido pelas mídias hegemônicas em todo o globo, parece ser nada mais que uma mobilização, readaptação, e encenação de uma interpretação particular da história da Ucrânia: a interpretação da extrema-direita bandeirista com base social predominante no oeste do país do leste europeu.
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