Fases da Revolução Chinesa

Por Luiz Eduardo Motta*

Segue abaixo o prefácio do livro “História da Revolução Chinesa” escrito por Klaus Scarmeloto e Igor da Silva Livramento e base do curso online História da Revolução Chinesa 1839 – 1949.

O livro de Klaus Scarmeloto e Igor da Silva Livramento sobre a Revolução Chinesa vem a ser um grande acréscimo na parca bibliografia sobre a China no Brasil. O livro se destaca por abarcar cem anos de lutas e de resistências da China ao colonialismo/imperialismo inglês e japonês e, internamente, contra as frações da aristocracia agrária e imperial que estavam articuladas ao poder colonial.

  Um dos maiores méritos desse texto de Scarmeloto e Livramento é o de ressaltar o papel de Sun Yat-sen na construção da Revolução Chinesa que culminará em 1949, por meio de Mao Zedong e do PCCh. É muito pouco conhecida, pelo menos no Brasil, a importância de Sun Yat-sen e do Kuomitang (que posteriormente sofreu desvio de seu programa inicial e revolucionário por Chiang Kai-shek) na construção de um programa nacionalista revolucionário.

Sun Yan-tsen, com efeito, é um dos pioneiros do nacionalismo revolucionário, e se fez presente nas lutas de libertação nacional que atravessaram na África, Ásia e América Latina, e foi internalizado por Mao Zedong e o PCCh. E a Revolução Chinesa de 1949, a primeira revolução anticolonial do século XX, tornou-se o paradigma das lutas anticoloniais, e da formação do que veio a ser chamado “Terceiro-Mundo”.

    A influência de Mao (e por tabela Sun Yat-sen) no pensamento terceiro mundista é percebida nos escritos de Fanon, Amilcar Cabral e John William Cooke, só para citarmos essas referências ligadas a essa perspectiva política/teórica, e que teve uma grande repercussão entre os anos 1950-1980. E, adicionemos também, o impacto das revoluções cubana, vietnamita e argelina para os movimentos revolucionários de libertação nacional.

    O nacionalismo revolucionário terceiro mundista que – como afirmei acima – teve em Mao a sua primeira grande referência – representou tanto uma ideologia como um movimento revolucionário para milhões que sofreram a superexploração e a coerção imperialista/colonial. Não vamos nos deter nesse prefácio sobre os muitos desvios que aconteceram nas formações sociais pós-coloniais.

Importa sim é afirmar que a ideologia nacionalista revolucionária, e da sua articulação com a teoria marxista, ainda se faz presente e necessária na constituição de um projeto alternativo ao imperialismo e ao neoliberalismo, sem falar da dita “nova esquerda”, cuja prática política é caracterizada tanto pela fragmentação como pela ausência de um projeto de unidade política nacional anti-imperialista e socialista ao se diluir em múltiplas e adversas “narrativas” que conduzem a um beco sem saída.

O nacionalismo revolucionário (ou populismo de esquerda, em sua acepção positiva como bem demarcou Laclau em seus primeiros escritos), enquanto uma ideologia tem o mérito de abarcar o máximo possível de segmentos em situação de exploração e opressão, indo para além do discurso meramente obrerista. A Revolução Chinesa é um exemplo vivo disso ao incorporar em larga escala os camponeses, além da pequena e média burguesia.

É o que precisamente Althusser afirmava da inexistência de uma classe já dada, i.e., da perspectiva teleológica do sujeito da história que se reduz à classe operária. Distintamente disso, o que há é um sujeito na história que corresponde as diferentes formações sociais com as suas contradições específicas. Daí, a visão acertada do PCCh de fomentar o papel revolucionário dos camponeses que representavam a maioria do setor subalterno e explorado na formação social chinesa pré-1949. Outro exemplo é o peronismo na Argentina.

 Não obstante o peronismo foi incorporado de formas distintas, tanto pela extrema direita da AAA (Aliança Anticomunista Argentina), como pelos Montoneros, FAP (Forças Armadas Peronistas) que representavam a esquerda revolucionária desse movimento, e sob influência do pensamento de John William Cooke, Hernandez Arrégui e Padre Carlos Mugica.

Atualmente, pelo menos desde a década passada, com a ascensão do kishnerismo, tem predominado a perspectiva progressista no interior do peronismo, e ainda é o maior movimento de massas do continente americano. Numa anedota citada por Hernandez Arrégui em seu livro Peronismo e socialismo há um diálogo entre Mao Zedong e uns estudantes argentinos maoístas, e um deles se dirigiu à Mao e afirmou que era maoísta. Mao riu e respondeu “se eu fosse argentino seria peronista”.

Essa anedota ilustra bem a visão de Mao sobre a questão nacional, pois não é importando modelos que uma revolução se constrói, mas sim ao articular suas lutas históricas nacionais num programa anti-imperialista para a constituição da transição socialista. E esse é um traço marcante em Mao Zedong e no PCCh ao incorporarem o legado dos movimentos revolucionários anticoloniais chineses pré-1949, e os ensinamentos de Sun Yat-sen, e simultaneamente o incorporarem ao marxismo.  

    Por isso, o livro de Scarmeloto e Livramento sobre a revolução Chinesa se faz presente e necessário, para que um amplo segmento de uma nova geração de militantes que emergiu nos últimos anos, e que insurgiu a determinadas correntes marcadas pelo esquerdismo míope de corte classista reducionista, e de um “internacionalismo” sem base – haja vista que as lutas nacionais anti-imperialistas têm caráter internacional – conheça a experiência revolucionária chinesa marcada por um forte acúmulo de resistência histórica, pois a transformação histórica se faz a partir da materialidade dessas lutas históricas, e não de retóricas abstratas e vazias profundamente marcadas por um idealismo vazio e irrealista.    

*Luiz Eduardo Motta é professor de Ciência Política na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

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